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Especial: 12 poemas de Mario Quintana que refletem sobre vida, tempo e amor

Clarissa Sayumi
15:03 25.11.2024
Arte e cultura

Especial: 12 poemas de Mario Quintana que refletem sobre vida, tempo e amor

Uma jornada pela obra de um dos maiores poetas brasileiros, explorando suas reflexões sobre a efemeridade da vida e a profundidade do amor

Clarissa Sayumi - 25.11.2024 - 15:03
Especial: 12 poemas de Mario Quintana que refletem sobre vida, tempo e amor
Mario Quintana. Foto: Divulgação.

Poeta, tradutor e jornalista brasileiro, Mario Quintana foi um dos maiores poetas do século 20. Nascido em Alegrete, no Rio Grande do Sul, em 30 de julho de 1906, teve uma infância marcada pela mudança para Porto Alegre em 1919, onde começou a publicar seus primeiros poemas.

Em 1940, lançou seu primeiro livro, A Rua dos Cataventos, que destacou sua habilidade em extrair musicalidade das palavras. Ao longo de sua vida, traduziu mais de cem obras de autores como Marcel Proust e Virginia Woolf. Sua poesia é caracterizada por uma linguagem simples e coloquial, abordando temas do cotidiano com ironia e profundidade.

Reconhecimento e Prêmios

Quintana recebeu diversos prêmios ao longo de sua carreira, incluindo o Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras em 1980 e o Prêmio Jabuti em 1981. Apesar de suas tentativas frustradas de entrar na Academia Brasileira de Letras, ele foi homenageado por grandes poetas como Manuel Bandeira.

Vida Pessoal

Quintana viveu a maior parte da vida em hotéis e nunca se casou nem teve filhos. Sua poesia era considerada por ele um “vício triste”, mas foi sua maior companheira. Faleceu em Porto Alegre em 5 de maio de 1994, deixando um legado literário significativo.

O Hotel Majestic, onde morou por 12 anos, foi transformado na Casa de Cultura Mário Quintana, um espaço que celebra sua vida e obra.

Vamos conhecer 10 poemas de Mario Quintana que refletem sobre vida, tempo e amor.

1. Bilhete

Se tu me amas, ama-me baixinho

Não o grites de cima dos telhados

Deixa em paz os passarinhos

Deixa em paz a mim!

Se me queres,

enfim,

tem de ser bem devagarinho, Amada,

Que a vida é breve, e o amor mais breve ainda…

2. Poeminha do Contra

Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão…

Eu passarinho!

3. Seiscentos e Sessenta e Seis

A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…

Quando se vê, já é 6ª-feira…

Quando se vê, passaram 60 anos!

Agora, é tarde demais para ser reprovado…

E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,

eu nem olhava o relógio

seguia sempre em frente…

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.

4. Presença

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,

teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento

das horas ponha um frêmito em teus cabelos…

É preciso que a tua ausência trescale

sutilmente, no ar, a trevo machucado,

as folhas de alecrim desde há muito guardadas

não se sabe por quem nalgum móvel antigo…

Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela

e respirar-te, azul e luminosa, no ar.

É preciso a saudade para eu sentir

como sinto – em mim – a presença misteriosa da vida…

Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista

que nunca te pareces com o teu retrato…

E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

5. A Rua dos Cataventos

Da vez primeira em que me assassinaram,

Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.

Depois, a cada vez que me mataram,

Foram levando qualquer coisa minha.

Hoje, dos meus cadáveres eu sou

O mais desnudo, o que não tem mais nada.

Arde um toco de Vela amarelada,

Como único bem que me ficou.

Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!

Pois dessa mão avaramente adunca

Não haverão de arrancar a luz sagrada!

Aves da noite! Asas do horror! Voejai!

Que a luz trêmula e triste como um ai,

A luz de um morto não se apaga nunca!

6. Canção do dia de sempre

Tão bom viver dia a dia…

A vida assim, jamais cansa…

Viver tão só de momentos

Como estas nuvens no céu…

E só ganhar, toda a vida,

Inexperiência… esperança…

E a rosa louca dos ventos

Presa à copa do chapéu.

Nunca dês um nome a um rio:

Sempre é outro rio a passar.

Nada jamais continua,

Tudo vai recomeçar!

E sem nenhuma lembrança

Das outras vezes perdidas,

Atiro a rosa do sonho

Nas tuas mãos distraídas…

7. Relógio

O mais feroz dos animais domésticos

é o relógio de parede:

conheço um que já devorou

três gerações da minha família.

8. Da felicidade

Quantas vezes a gente, em busca da ventura,

Procede tal e qual o avozinho infeliz:

Em vão, por toda parte, os óculos procura

Tendo-os na ponta do nariz!

9. Das utopias

Se as coisas são inatingíveis… ora!

Não é motivo para não querê-las…

Que tristes os caminhos, se não fora

A presença distante das estrelas!

10. Envelhecer

Antes, todos os caminhos iam.

Agora todos os caminhos vêm

A casa é acolhedora, os livros poucos.

E eu mesmo preparo o chá para os fantasmas.

11. Do amoroso esquecimento

Eu agora — que desfecho!

Já nem penso mais em ti…

Mas será que nunca deixo

De lembrar que te esqueci?

12. Emergência

Quem faz um poema abre uma janela.

Respira, tu que estás numa cela

abafada,

esse ar que entra por ela.

Por isso é que os poemas têm ritmo —

para que possas profundamente respirar.

Quem faz um poema salva um afogado.

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