História da música ‘Marina’, no aniversário de Dorival Caymmi
História da música ‘Marina’, no aniversário de Dorival Caymmi
Dia do grande artista baiano Dorival Caymmi, um dos maiores nomes da música popular brasileira de todos os tempos
Você conhece a história da música Marina, de Dorival Caymmi?
Hoje é dia de comemorar o aniversário do grande artista baiano Dorival Caymmi, um dos maiores nomes da música popular brasileira de todos os tempos. Dorival nasceu há exatos 110 anos, em 30 de abril de 1914.
E, para homenagear o aniversariante do dia e seguir homenageando grandes compositores da nossa música popular brasileira, nós damos continuidade à série Saudando Grandes Compositores da MPB, em que contamos a história de grandes clássicos das carreiras desses artistas.
Sobre Dorival Caymmi
Dorival Caymmi foi um artista múltiplo: cantor, compositor, instrumentista, poeta, pintor e ator. Compunha como ninguém sobre os hábitos, costumes e tradições da sua terra, a Bahia, e do povo baiano, tendo forte influência da música e da cultura negra, reforçando a ancestralidade africana.
Nascido em Salvador, começou a se interessar por música e pintura ainda menino. O pai era músico amador e a mãe cantava muito bem. Aos 20 anos, estreou como cantor e violonista em programas da Rádio Clube da Bahia e logo passou a apresentar o musical Caymmi e Suas Canções Praieiras.
Com 22 anos, venceu, como compositor, o concurso de músicas de carnaval com o samba A Bahia Também Dá. Logo, mudou-se para o Rio de Janeiro e passou a cantar suas composições na rádio e em programas de calouro.
Em 1938, aos 24 anos, Caymmi compôs o grande clássico O Que É Que a Baiana Tem?, que virou um grande sucesso na voz de Carmen Miranda, em sua interpretação para o filme Banana da Terra. Com a canção, a Pequena Notável ganhou projeção internacional e seguiu carreira em Hollywood.
A partir daí, Dorival Caymmi foi responsável por compor inúmeros sucessos que transformaram para sempre a história da cultura do nosso país.
Além dos temas importantes que retratava, suas canções eram poesia pura e dispunham de uma impressionante riqueza rítmica e melódica, tendo uma relevância imensa para a formação do que se chamou de música popular brasileira.
Entre os seus principais sucessos estão alguns dos maiores clássicos da MPB, como, por exemplo:
- Saudade da Bahia;
- Samba da Minha Terra;
- Vatapá;
- Você Já Foi à Bahia?;
- Só Louco;
- Suíte do Pescador;
- Doralice (parceria com Antônio Almeida);
- Marina; Maracangalha;
- Oração de Mãe Menininha;
- Modinha para Gabriela (feita especialmente para a novela Gabriela, inspirada no romance Gabriela Cravo e Canela, do também baiano Jorge Amado);
- A Lenda do Abaeté;
- É Doce Morrer no Mar (música sua para os versos de Jorge Amado);
- Saudade de Itapoã;
- O Mar;
- e Rosa Morena; entre muitos outros.
Com a forte influência e relevância de Dorival Caymmi, sua família tornou-se um verdadeiro caldeirão musical: seus três filhos são Dori, Danilo e Nana Caymmi – nomes importantíssimos da nossa música brasileira – e suas netas Alice e Juliana seguiram o mesmo caminho. Sua esposa, Stella Maris, também era cantora de rádio.
Dorival Caymmi nos deixou em 2008, aos 94 anos, tendo transformado para sempre a história da música popular brasileira e deixado um legado imensurável para o nosso povo e nossa cultura.
Caymmi foi gravado pelos principais nomes da música brasileira e influenciou uma geração inteira de artistas que vieram depois.
Ai que saudade eu tenho de Dorival Caymmi! Até porque, quem não gosta de Caymmi bom sujeito não é! É ruim da cabeça, ou doente do pé!
Hoje, para prestar uma homenagem a este artista tão importante da nossa música, vamos contar a história de um de seus maiores sucessos: a canção Marina, lançada em 1947.
História da canção Marina, de Dorival Caymmi
Certa vez, em entrevista à TV Cultura, Dorival Caymmi contou que suas tantas músicas com nomes de mulheres, não foram inspiradas em mulheres específicas, mas sim na mulher no geral.
Que motivações diferentes ou ocasiões e incidentes poéticos o levaram a escrever suas canções: Dora, por exemplo, foi uma dançarina pernambucana de frevo que ele conheceu.
Já com Marina, foi uma frase de seu filho do meio – o hoje também músico Dori Caymmi – na época com três anos de idade, que lhe deu a inspiração para o que seria o final da canção.
Caymmi estava saindo de casa e o filho, que estava chateado porque queria mais atenção do pai naquele momento, soltou – com a cara zangada – a genuinamente infantil frase: “Tô de mal com você!”.
“Na rua, essa frase ficou martelando minha cabeça. ‘Estou de mal, estou de mal, estou de mal…”, conta Dorival, enquanto revela que o nome Marina apenas foi um nome bonito que lhe veio à mente na hora e que não era nenhuma mulher específica que ele conhecesse.
“Enquanto ia à rádio, comprava umas coisas, andava nas ruas, a melodia e a letra foram se compondo em minha cabeça. No fim do dia, a música estava pronta.”, conclui.
A música que foi se construindo em sua mente para chegar na frase final: “Tô de mal com você!”, tornou-se um dos principais sambas-canção da história da MPB. Só em 1947, foi lançado em nada menos que quatro gravações, de quatro grandes vozes da música brasileira da época: uma com Francisco Alves, outra por Dick Farney, uma outra com Nelson Gonçalves e ainda a interpretação do próprio Dorival Caymmi.
Quebrava-se ali uma espécie de acordo instituindo não oficialmente na indústria musical da época, de que o cantor que lançasse uma música teria pelo menos um ano de exclusividade sobre ela.
Anos depois, quem gravou Marina com muito sucesso, em seu álbum Realce, foi o também baiano Gilberto Gil, que considera Dorival Caymmi uma de suas maiores referências na música.
Questionamentos sobre a letra
Embora muitas vezes questionada como uma canção machista, que coloca a mulher como “propriedade” do homem, ciumento em vê-la usando maquiagem e ficando bonita aos olhos de outras pessoas, Marina é – além de, sim, o retrato de um tempo realmente ainda mais machista do que o que vivemos hoje e de um eu-lírico tomado por este machismo e patriarcado – também uma declaração de Dorival Caymmi às coisas simples e naturais da vida, como ele faz ao cantar sobre o mar e sobre as belezas de sua terra.
Quando ele diz que Marina já é bonita “com que Deus lhe deu”, ele também diz que acha a beleza natural de Marina muito melhor do a que beleza que acreditamos adquirir quando colocamos uma maquiagem.
Hoje, quase 80 anos depois da composição de Marina, nós mulheres – ainda bem! – já entendemos que podemos ser bonitas com ou sem maquiagem, do jeito que quisermos e que nos sentirmos melhor conosco mesmas, e não para agradar os olhos de um homem ou de uma sociedade.
E que podemos usar – ou não usar! – a maquiagem que quisermos, quando bem entendermos. Nosso rosto e nosso corpo não é de ninguém, além de nosso: “Eu sou meu próprio lar”, como diz a forte canção Triste, Louca ou Má, da banda Francisco El Hombre.
Marina – Dorival Caymmi (1947)
Marina, morena
Marina, você se pintou
Marina, você faça tudo
Mas faça um favor
Não pinte esse rosto que eu gosto
Que eu gosto e que é só meu
Marina, você já é bonita
Com o que Deus lhe deu
Me aborreci, me zanguei
Já não posso falar
E quando eu me zango, Marina
Não sei perdoar
Eu já desculpei muita coisa
Você não arranjava outra igual
Desculpe, Marina, morena
Mas eu tô de mal
Uma curiosidade: muitos anos depois, a bisneta de Dorival Caymmi, filha de uma das filhas de Nana Caymmi, recebeu o nome de Marina.
Gostou de saber mais sobre as histórias de grandes canções da nossa música popular brasileira? Continue acompanhando a nossa série Saudando Grandes Compositores da MPB. Hoje, homenageamos o aniversariante Dorival Caymmi.
Viva o eterno Dorival Caymmi!
por Lívia Nolla