A história da música Pais e Filhos – Aniversário de Renato Russo
A história da música Pais e Filhos – Aniversário de Renato Russo
Se estivesse vivo, Renato Russo estaria completando 64 anos neste 27 de março de 2024. O cantor, compositor, produtor e multi-instrumentista foi – por 14 anos, de 1982 a 1986 – líder e vocalista de uma das mais importantes bandas do cenário rock brasileiro de todos os tempos e fez história com … Continued
por Lívia Nolla
Se estivesse vivo, Renato Russo estaria completando 64 anos neste 27 de março de 2024.
O cantor, compositor, produtor e multi-instrumentista foi – por 14 anos, de 1982 a 1986 – líder e vocalista de uma das mais importantes bandas do cenário rock brasileiro de todos os tempos e fez história com suas canções, consagradas até os dias de hoje, influenciando toda uma geração para sempre: a Legião Urbana.
Um dos maiores poetas da MPB de todos os tempos, suas letras geniais, carregadas de ideais, sensibilidade e críticas sociais e sua interpretação única, carregam uma legião, com o perdão do trocadilho, de fãs pelo Brasil inteiro.
E, para homenagear o aniversariante do dia e seguir homenageando grandes compositores da nossa música popular brasileira, nós damos continuidade à série Saudando Grandes Compositores da MPB, em que contamos a história de grandes clássicos das carreiras desses artistas.
Sobre Renato Russo
Nascido Renato Manfredini Júnior, no Rio de Janeiro, em 1960, Renato adotou o sobrenome artístico “Russo” em homenagem ao filósofo inglês Bertrand Russell; ao filósofo, escritor e compositor suíço Jean-Jacques Rousseau e ao artista francês Henri Rousseau (ambos lê-se Russô).
O artista viveu dos sete aos dez anos em Nova York, nos Estados Unidos, por conta de uma transferência profissional de seu pai, sendo introduzido à língua e à cultura norte-americana.
Aos 13 anos, voltou ao Brasil e passou a morar em Brasília. Estudou Jornalismo, foi professor de inglês e repórter, antes de dedicar-se inteiramente à música. Participou da banda Aborto Elétrico – grupo da cena punk de Brasília, que também originou o Capital Inicial – depois seguiu uma pequena carreira como o Trovador Solitário, antes de assumir os vocais da Legião Urbana.
Com a Legião – acompanhado de Marcelo Bonfá, Dado Villa-Lobos e inicialmente também Renato Rocha – Renato Russo escrevia canções que “conversavam sobre experiências urbanas do que é ser um jovem brasileiro vivendo a partir dos anos 70, com traços românticos e narrativos nas letras”, como ele mesmo descreveu em entrevista.
Letras essas as com as quais os jovens se identificavam muito e que Renato dizia não gostar de explicar o significado, pois preferia que cada pessoa identificasse as mensagens das canções dentro do seu universo interior.
Entre seus principais sucessos com a banda, lançados em oito álbuns de estúdio, estão grandes hits como:
Que País É Esse?; Faroeste Caboclo; Eduardo e Mônica; Tempo Perdido, Índios; Música Urbana; Ainda é Cedo; Por Enquanto; Eu Sei; Monte Castelo; e Geração Coca-Cola (todas composições solo de Renato);
Será; Pais e Filhos, Há Tempos, Quando o Sol Bater na Janela do Seu Quarto, O Teatro dos Vampiros, O Mundo Anda Tão Complicado; Vento no Litoral; Meninos e Meninas; Dezesseis; Giz; A Via Láctea e Perfeição (todas composições de Renato, Dado e Bonfá);
Quase Sem Querer (de Renato Russo, Dado e Renato Rocha);
Angra dos Reis (de Renato Russo, Renato Rocha e Marcelo Bonfá);
E Hoje a Noite Não Tem Luar (versão em português para Hoy Me Voy Para México, da boy band porto-riquenha Menudo, criada por Carlos Colla)
A despedida de Renato Russo
Em 1989, Renato Russo descobriu ser HIV positivo. Ele nunca assumiu isso publicamente em vida. Logo que descobriu, se reuniu com o empresário Rafael Borges e pediu a ele que organizasse tudo após sua morte.
Em 1994 e 1995, Renato lançou – paralelamente à banda – dois álbuns solo. O primeiro, The Stonewall Celebration Concert, contou com 21 faixas com Renato Russo cantando em inglês, com composições de nomes como Bob Dylan, Billy Dean, Madonna, Quincy Jones e Lionel Richie.
O álbum é uma homenagem aos vinte cinco anos da famosa Rebelião de Stonewall, em Nova Iorque, de luta pelos direitos da comunidade LGBTQIA+. Parte dos royalties do disco foi doada à campanha Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, criada pelo sociólogo e ativista Herbert de Souza, o Betinho, que morreu em 1997, vítima da AIDS.
O encarte traz informações sobre entidades sociais de proteção às crianças e mulheres, à natureza e aos homossexuais e portadores do HIV.
Em 1995, Renato lançou o seu segundo álbum solo, Equilíbrio Distante, em que trouxe 13 regravações de canções em italiano, lançadas originalmente por cantores do país europeu, como Laura Pausini e Fiorella Mannoia. Renato viajou à Itália para aprofundar suas pesquisas para o disco, onde também pesquisou bastante sobre seus antepassados.
Renato faleceu em outubro de 1996, 21 dias após o lançamento do disco A Tempestade ou o Livro dos Dias, com a Legião Urbana. A causa da morte foi doença pulmonar obstrutiva crônica, septicemia e infecção urinária, todas consequências da AIDS.
Onze dias após a morte do cantor, Dado Villa Lobos e Marcelo Bonfá, ao lado do empresário Rafael Borges, anunciaram o fim das atividades da Legião Urbana, mas ainda lançaram três discos póstumos que estavam em contrato com a gravadora.
Você pode conferir todos os detalhes sobre a história de Renato Russo e da banda, na audiobiografia original e exclusiva Novabrasil – Acervo MPB Especial Legião Urbana.
Ou também nesta matéria especial que publicamos no ano passado, sobre a trajetória de Renato, e que conta com uma Playlist Especial, que traz as principais canções do aniversariante do dia, em ordem cronológica de lançamento.
Hoje, para prestar mais uma homenagem a Renato Russo, este artista tão importante da nossa MPB, vamos contar a história de um de seus maiores sucessos: Pais e Filhos.
História de Pais e Filhos
Embora não gostasse muito de explicar as histórias por trás de suas letras e composições, Renato Russo achou muito importante falar sobre o que o levou a escrever Pais e Filhos, em uma icônica participação da banda Legião Urbana no Programa Livre, apresentado por Serginho Groisman no SBT, em 1994.
Isso porque, apesar de sentir-se feliz pelo sucesso da música entre os jovens em seus shows e participações em programas, ele se incomodava de ver que a canção – composta pelo trio Renato, Dado e Bonfá, em 1989, para o álbum As Quatro Estações – era entoada em tom festivo.
Antes de começar a tocar Pais e Filhos, Renato fez um alerta aos jovens que assistiam ao Programa Livre: “Escuta, vocês sabem que essa música é sobre suicídio, né? É uma música muito, muito séria e me desgasta pra c*** quando a gente toca, e as pessoas não percebem.”.
Pais e Filhos é uma canção de dor, que fala do suicídio de uma garota que se jogou do quinto andar por conta da depressão que sofria e também fala sobre um desencontro, um conflito entre gerações e dos problemas muitas vezes enfrentados entre os jovens e seus pais, que não se compreendem.
Renato continuou a falar sobre a música e sobre saúde mental: ”Agora eu tô legal e tudo, mas eu estive muito mal na minha vida. Eu estive muito, muito mal quando era mais jovem. Eu ficava confuso, estava perdido da cabeça mesmo. E agora encontrei meu caminho. Eu gostaria de ter idade de vocês e de repente estar legal, mas não. Eu quase joguei fora metade da minha vida com o sucesso e tudo, foi tudo embora. Por causa de drogas, por causa de… sabe, mal!”.
E completou falando sobre a relação do público com os sucessos dos seus ídolos: “E de repente, às vezes, essas músicas refletem um momento na minha vida que eu não gosto de lembrar mais. Eu prefiro tocar uma outra coisa. A gente vai tocar ‘Pais e Filhos’, mas eu gostaria – já que aqui o artista tem o espaço livre para falar – eu gostaria de lembrar a todos vocês que estão aqui numa boa, que de repente, sabe, é importante o público respeitar o artista também nesse sentido.”.
Em um show da Legião Urbana, quatro anos antes dessa declaração no Programa Livre, Renato já alertava o seu público sobre saúde mental, antes de cantar Pais e Filhos: “Às vezes parece que tudo fica tão difícil, que realmente a vontade que a gente tem é de sumir. Mas, pra todas as pessoas que pensam nesse tipo de alternativa, a gente sempre pode tentar a vida em outro lugar, e a gente sempre pode ser feliz. E essa música é sobre isso, e é dedicada a todos vocês.”.
Escute Renato Russo cantando Pais e Filhos neste exato dia que mencionamos acima.
Confira a letra de Pais e Filhos:
Estátuas, e cofres, e paredes pintadas
Ninguém sabe o que aconteceu
Hum, ela se jogou da janela do quinto andar
Nada é fácil de entender
Dorme agora
Hum, hum
É só o vento lá fora
Quero colo
Vou fugir de casa
Posso dormir aqui com vocês?
Estou com medo
Tive um pesadelo
Só vou voltar depois das três
Meu filho vai ter nome de santo
Quero o nome mais bonito
É preciso amar
As pessoas como se não houvesse amanhã
Porque se você parar pra pensar
Na verdade, não há
Me diz por que que o céu é azul
Explica a grande fúria do mundo
São meus filhos que tomam conta de mim
Eu moro com a minha mãe, mas meu pai vem me visitar
Eu moro na rua, não tenho ninguém
Eu moro em qualquer lugar
Já morei em tanta casa que nem me lembro mais
Eu moro com meus pais
Gostou de saber mais sobre as histórias de grandes canções da nossa música popular brasileira? Continue acompanhando a nossa série Saudando Grandes Compositores da MPB. Hoje, homenageamos o aniversariante Renato Russo.