Literatura africana: 16 livros que você precisa ler para saber mais sobre o assunto
Literatura africana: 16 livros que você precisa ler para saber mais sobre o assunto
Reflexões sobre o impacto da cultura africana na identidade brasileira e a intersecção com a literatura africana de língua portuguesa
Mais de 4,3 milhões de candidatos inscritos no Enem desse ano se depararam com o tema da redação: ‘Desafios para a valorização da herança africana no Brasil’.
Os caminhos para a formulação do texto eram muitos, a história da escravização e a influência da cultura africana na identidade brasileira, na cultura, culinária, linguagem, músicas, religiões ou na literatura. E como a valorização desse legado é inviabilizada pelo racismo estrutural, sem esquecer da luta de resistência do povo negro.
A construção dessa estrutura de redação está viva na literatura africana que reflete as complexas histórias, culturas e tradições dos países que compõe o continente. Assim, podemos falar em literaturas africanas.
A literatura em língua portuguesa, em particular, tem raízes profundas nas experiências de colonização e luta pela independência, especialmente em países como Angola e Moçambique.
Durante a colonização, que se estendeu até o século 19, a literatura era predominantemente oral e marcada pela influência da cultura europeia. As narrativas eram muitas vezes utilizadas para perpetuar a dominação colonial, mas também começaram a emergir vozes que questionavam essa opressão.
“Espontaneidades da minha alma”, do autor angolano José da Silva Maia Ferreira, foi a primeira obra africana em língua portuguesa a ser impressa, em 1849, apesar de a narrativa manuscrita “Tratado breve dos reinos (ou rios) da Guiné”, do cabo-verdiano André Álvares de Amada, seja de 1594.
Depois, na pré-Independência, com o aumento dos movimentos anticoloniais nas décadas de 1940 e 1950, a literatura começou a refletir as lutas pela liberdade.
Escritores como Noémia de Sousa e Pepetela emergiram nesse contexto, abordando questões sociais e políticas que refletiam a luta pela independência.
Já após as independências conquistadas nas décadas de 1970 e 1980, a literatura passou a celebrar a cultura africana e a explorar questões identitárias, sociais e políticas. Autores como Mia Couto e Paulina Chiziane emergiram como vozes poderosas nesse período.
Relação com o Brasil
A conexão entre a literatura africana e brasileira é significativa, especialmente devido à história da escravização que trouxe 4,8 milhões de africanos para o país. Essa herança cultural é visível na literatura afro-brasileira contemporânea, que busca resgatar e valorizar as experiências e identidades africanas.
A partir de 2003, com a promulgação da lei nº 10.639 no Brasil, que torna obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas, houve um aumento no interesse pela literatura africana. Essa legislação incentivou as instituições educacionais brasileiras a integrar obras africanas em seus currículos.
Embora a influência de autores africanos na literatura brasileira tenha sido silenciada historicamente, a cultura africana está profundamente enraizada na literatura brasileira.
Autores como Maria Firmina dos Reis – considerada a primeira escritora brasileira, pioneira na crítica antiescravista da nossa literatura –, Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, abordam questões relacionadas à identidade negra, refletindo as experiências afrodescendentes no Brasil.
A interconexão entre as literaturas africanas e brasileiras enriquece ambas as tradições literárias, promovendo uma compreensão mais ampla das identidades culturais em contextos históricos semelhantes.
Livros Essenciais da Literatura Africana em Português
Conversamos com a Helen Cypriano, da Quilombo Literário, e pedimos indicações de literatura africana. Confira!
- Mohamed Mbougar Sarr com o livro “Homens de Verdade” pela editora Malê. Inclusive, esse autor esteve na Flip esse ano e foi uma das sensações.
- Buchi Emecheta é uma das autoras africanas que mais li. Indico “As alegrias da maternidade” e “Cidadã de segunda classe“.
- Paulina Chiziane com o livro “Niketche uma história de poligamia“. Ganhou o Prêmio Camões, um dos mais importantes prêmios de língua portuguesa lusófona. Uma obra que discute as complexidades das relações familiares na sociedade moçambicana.
- Trevor Noah, indico o ” Nascido do crime: Histórias da minha infância na África do Sul”. O livro conta a história impressionante, inspiradora e divertida da infância e juventude de Trevor Noah, um dos maiores comediantes da atualidade, ambientada durante os anos finais do apartheid e os dias tumultuosos de liberdade que se seguiram.
A Rosângela Machado, do Letras Africanas, também nos contou suas obras africanas essenciais:
O mundo se despedaça – Chinua Achebe: narra a história de Okonkwo, guerreiro de um clã que se desintegra depois da chegada do homem branco e de suas instituições. Um dos mais importantes autores africanos da atualidade, Achebe recebeu o Man Booker International em 2007.
Balada de amor ao vento – Paulina Chiziane: primeiro romance de Paulina Chiziane, este livro conta a história de amor de Sarnau e Mwando e traz a semente do que viria a ser o clássico Niketche. Leitura obrigatória do vestibular da Fuvest.
Nós matamos o cão tinhoso – Luís Bernardo Honwana: um conto que retrata as dificuldades da vida sob o colonialismo em Moçambique.
A última Tragédia – Abdulai Silas: o autor situa a saga da jovem Ndani, suposta hospedeira de azar, como no período anterior à independência da Guiné, retratando habilmente o cotidiano da capital e do interior de seu país.
Terra sonâmbula – Mia Couto: um romance que explora a guerra civil em Moçambique através de uma narrativa poética.
O vendedor de passados – José Eduardo Agualusa: o narrador é uma osga que conta os fatos quem envolvem Félix Ventura, um albino africano que vende passados para aqueles que o procuram em busca de uma nova identidade.
Bom dia, Camaradas – Ondjaki: premiado autor angolano, resgata de forma lírica a infância de um garoto de classe média num país dividido entre a tradição e o novo.
Um defeito de cor – Ana Maria Gonçalves: Livro que inspirou o samba enredo da Portela, no carnaval de 2024. A fascinante história de uma africana em busca do filho perdido que se tornou um clássico da literatura contemporânea.
O crime do Cais do Valongo – Eliana Alves: Um corpo amanhece em um beco, envolto em uma manta e com pequenas partes cortadas. O crime do cais do Valongo, de Eliana Alves Cruz, é um romance histórico-policial que começa em Moçambique e vem parar no Rio de Janeiro, mais exatamente no Cais do Valongo.
Outras obras:
- Mayombe (1980) – Pepetela: Um relato sobre a luta pela independência em Angola, mesclando elementos autobiográficos e ficcionais.
- Os Flagelados do Vento Leste (1960) – Manuel Lopes: Uma narrativa sobre a vida rural em Cabo Verde.
- Cafundó: A África no Brasil – Carlos Vogt e Peter Fry: Um estudo sobre uma comunidade negra no Brasil que preserva sua cultura através da linguagem.
Clubes de Livros
Aqui vai uma indicação de clubes de livros especializados em literatura africana:
A literatura africana é uma janela para entender as complexidades culturais e históricas do continente. Ao ler obras de autores africanos, os leitores podem entrar em contato com narrativas que moldam identidades e resistências. A conexão entre África e Brasil é um tema fértil para exploração literária, revelando laços profundos que transcendem oceanos e podem transpor os desafios para a valorização da herança africana no país.