
Especial Jorge Ben Jor – PARTE 1
Especial Jorge Ben Jor – PARTE 1
Hoje é aniversário de um dos maiores artistas da música popular brasileira de todos os tempos: Jorge Ben Jor. O cantor, compositor e multi-instrumentista carioca – nascido Jorge Duílio Lima Meneses, em Madureira, mas criado no Rio Comprido – influenciou uma geração de artistas com sua originalidade e inventividade, estilo próprio e único de tocar … Continued


Hoje é aniversário de um dos maiores artistas da música popular brasileira de todos os tempos: Jorge Ben Jor.
O cantor, compositor e multi-instrumentista carioca – nascido Jorge Duílio Lima Meneses, em Madureira, mas criado no Rio Comprido – influenciou uma geração de artistas com sua originalidade e inventividade, estilo próprio e único de tocar e compor.
A idade real do artista é motivo de muitas especulações: ele diz ter nascido em 1945 e documentos divulgados em sua biografia datam de 1939, mas isso não importa, o que sabemos é que são aproximadamente 80 anos de muito talento e genialidade!
Ele é um dos poucos artistas que conseguiram não se filiar a nenhuma corrente na música popular e deixar que as correntes da MPB se filiassem a eles.
Seu estilo característico possui diversos elementos, entre eles: rock and roll, samba, soul, bossa nova, jazz, maracatu, funk, ska, jongo e hip hop, com letras alegres e também trazendo temas filosóficos e esotéricos.

A obra de Jorge Ben Jor tem uma importância singular para a música brasileira, por incorporar elementos novos no suíngue e na maneira de tocar violão, criando uma batida única – assim como fez João Gilberto, uma de suas grandes influências.
Mas o que Ben Jor faz não é bossa nova, nem samba, nem rock, nem soul, nem funk. É uma mistura inconfundível e deliciosa de todos esses elementos.
Além disso, ele trouxe influências árabes e africanas para a sua música, oriundas de sua mãe, nascida na Etiópia. Outras influências que o acompanham incluem o baião de Luiz Gonzaga e o rock de Little Richard. Também o samba de Ataulfo Alves – de quem seu pai era amigo.
Preparamos duas matérias especiais sobre a vida e a obra deste grande cara que é Jorge Ben Jor. Uma vai ao ar hoje e a outra amanhã, aqui no nosso site.
Aproveite!

O início de tudo
O pai de Jorge Ben Jor era estivador, mas também cantava, compunha e tocava pandeiro no bloco Cometas do Bispo, no qual Jorge debutou na música, tocando surdo. Ele também frequentava, com o pai, os ensaios da escola de samba Salgueiro.
Depois, Jorge passou para o pandeiro – que aprendeu a tocar com 13 anos – e teve contato também com a música cristã, quando foi seminarista, onde fez aulas de canto e de instrumentos.
O menino queria ser jogador de futebol e chegou a integrar o time infanto-juvenil do Flamengo. Mas acabou seguindo o caminho da música, presente em sua vida desde criança, para a nossa sorte! Aos 18 anos, Jorge ganhou um violão de sua mãe e começou a se apresentar em festas e boates, tocando bossa nova e rock and roll.
Ali, ele começou a pavimentar o caminho que o faria alçar alto voo artístico, ainda que a primeira atuação profissional, tenha sido em 1961, como pandeirista acompanhante do Copa Trio, em shows no famoso Beco das Garrafas, point de bares e boates do Rio de Janeiro, reduto da bossa nova.
Já começando a misturar as informações do rock, canto gregoriano e da música brasileira com a matriz africana, Jorge Ben Jor integrou a lendária Turma da Tijuca, que frequentava o Bar do Divino, ao lado de nomes como Erasmo Carlos, Roberto Carlos e Tim Maia (que tinha o mesmo apelido de Jorge na época, Babulina, por conta da pronúncia do rockabilly Bop-A-Lena, de Ronnie Self, o qual eles cantavam muito).
Desta forma, Jorge também tinha bastante contato com o que veio a ser – pouco tempo depois – a Jovem Guarda.

Inovação já no primeiro álbum
Aos poucos, Jorge Ben Jor criou uma batida diferente ao violão, que dividiria águas na música brasileira, ao ser apresentada formalmente em 1963 no seu primeiro álbum, apropriadamente intitulado Samba Esquema Novo.
Ao passar a ter interesse pela música, o artista vivenciou uma época na qual a bossa nova predominava no mundo. A exemplo da maioria dos músicos de então, ele foi inicialmente influenciado por João Gilberto, pelo jeito de tocar o violão e cantar, mas, desde o início, Jorge Ben Jor foi bastante inovador.
Sua música, desde sempre, teve uma forte predominância do ritmo, tinha um groove muito dançante, cheio de suingue. Os puristas achavam que ela era moderna demais e, por isso, era difícil para os músicos da época acompanhá-lo, tanto assim que seus primeiros discos foram gravados com um conjunto que tocava samba jazz no Beco das Garrafas, o Meirelles e os Copa Cinco, liderado pelo saxofonista J. T. Meirelles.
Em 1963, ele subiu no palco e cantou Mas que Nada – canção que já tinha gravado como vocalista do conjunto do organista Zé Maria, junto com Por Causa de Você – para uma pequena plateia, que incluía um executivo da gravadora Philips. Dois meses depois, era lançado o primeiro compacto de Jorge Ben, que incluiu essas duas canções.
No mesmo ano, Jorge Ben Jor lançou o primeiro LP, Samba Esquema Novo, acompanhado pelo conjunto de samba jazz Meirelles e os Copa Cinco.
Nessa época, ele usava o nome artístico Jorge Ben (o “Ben” vem do sobrenome etíope de sua mãe), e – só depois que passou a fazer sucesso também internacionalmente e a ter seu nome confundido com o do cantor e guitarrista norte-americano de jazz, George Benson – que ele passou a acrescentar um “Jor” no fim de seu nome, tornando-se Jorge Ben Jor.
Com a inovação, originalidade e musicalidade impressionantes do seu disco de estreia, Jorge Ben Jor tornou-se unânime entre os críticos musicais da época. Mas que Nada foi seu primeiro grande sucesso no Brasil e também é uma das canções em língua portuguesa mais executadas nos Estados Unidos até hoje, na versão do pianista brasileiro Sérgio Mendes (que primeiro a gravou em 1966 e depois regravou remixada com o grupo de hip hop norte-americano Black Eyed Peas, em 2006), tendo ainda sido regravada por artistas como Ella Fitzgerald e Al Jarreau.
Outros grandes sucessos deste primeiro disco, que contém 11 composições solo de Jorge Ben Jor e uma parceria dele com Codó, são os mega hits: Chove Chuva, Balança Pema e Rosa, Menina Rosa. O disco atingiu um total de 100 mil cópias vendidas, marca incomum para a época, e está na lista dos 100 melhores discos da música brasileira – elaborada pela Revista Rolling Stone, em 2007 – na 15º posição.

Um sucesso atrás do outro
Em 1964, Jorge Ben Jor lançou os LPs Sacundin Ben Samba (que conta com músicas como Anjo Azul e Nena-Nanã) e Ben é Samba Bom (com destaque para canções como Samba Legal e Oba-Lá-Lá) . No ano seguinte, viajou para os Estados Unidos, a convite do Ministério das Relações Exteriores, apresentando-se em clubes e universidades, durante três meses.
Chegou a participar de programas antagônicos como O Fino da Bossa e Jovem Guarda, da TV Record. Nessa época, algumas de suas canções foram gravadas nos Estados Unidos: Mas que Nada e Chove Chuva, por Sérgio Mendes, que chegaram às paradas de sucesso norte-americanas; Zazoeira, por Herp Albert; e Nena Naná, por José Feliciano.
Em 1965, ele lançou o disco Big Ben, que traz os clássicos Deixa o Menino Brincar (composição de Babu); e Agora Ninguém Chora Mais (dele mesmo). Em 1967, foi a vez do disco O Bidu – Silêncio no Brooklin, que leva esse nome porque, na época, Ben Jor morava no Brooklin – em São Paulo – com o amigo Erasmo Carlos e tinha o apelido de Bidu. Os ensaios em casa iam até tarde e muitas vezes os vizinhos se incomodavam com o barulho e pediam silêncio.
Desse disco destaca-se a canção em parceria com Erasmo, Menina Gata Augusta, e também Amor de Carnaval, composição só de Jorge, que abre o álbum.
Veja também:
No ano seguinte, o artista participou do IV Festival Internacional da Canção, da TV Globo, interpretando Charles, Anjo 45, música de sua autoria, incluída no seu próximo LP, Jorge Ben, de 1969.
Depois, a música foi gravada com sucesso também por Caetano Veloso, que disse que nunca uma música havia tocado tanto ele da primeira vez que ele tinha ouvido, na primeira audição da música, como Charles, Anjo 45.
Sobre essa música, Jorge contou em entrevista ao Roda Viva, programa da TV Cultura: “Na época, foi uma homenagem a um malandro que eu conheci, que era o Robin Hood [referência ao mito inglês que roubava dos ricos para dar aos pobres], da época, dos morros. E ele sempre tinha que voltar para os morros. Quando ele voltava para o morro, a paz voltava para o morro, quando ele não estava no morro, era tudo que eu contava na música. (…) Charles, anjo 45 foi feita e inspirada no malandro carioca. E, além de tudo, Charles, Anjo 45 porque ele usava uma 45 [tipo de arma] e ele era um anjo, porque quando ele chegava tudo ficava bem. Tudo se transformava”.
Este disco de Jorge Ben Jor foi importantíssimo, porque também apresentou ao mundo outros grandes clássicos, verdadeiros hits do artista, como: Crioula, Take It Easy my Brother Charles, Bebete, Vãobora, Que Pena (Ela Já Não Gosta Mais De Mim), Domingas e Cadê Tereza (essas duas últimas feitas em homenagem a sua única e verdadeira musa inspiradora, Domingas Terezinha, sua esposa desde 1971 e mãe de seus dois filhos, Gabriel e Tomaso).
Além dessas, é desse disco o praticamente hino informal brasileiro, um cartão-postal do Brasil – País Tropical – que foi – primeiramente – gravada por Wilson Simonal, no mesmo ano, fazendo com que a canção estourasse em todo o país. Gal Costa também gravou a música – que hoje é uma das mais famosas da história da MPB – em 1969.

Mais contribuições importantíssimas para a nossa música
Em 1970, Jorge Ben Jor gravou o LP Força Bruta, com destaque para os grandes sucessos: Oba, Lá Vem Ela; Mulher Brasileira; Domenica Domingava Num Domingo Linda Toda de Branco; e O Telefone Tocou Novamente.
No ano seguinte, lançou o LP Negro é Lindo, em que vociferava o crescente movimento de valorização do povo negro, unindo ritmos americanos e brasileiros de origem africana.
Entre as importantes canções: a faixa-título; Porque é Proibido Pisar na Grama; Que Maravilha (em parceria com Toquinho, que já havia sido gravada por Toquinho e por Simonal e que depois fez muito sucesso em uma versão com Os Paralamas, no fim dos anos 90); Cassius Marcello Clay (também em parceria com Toquinho); Maria Domingas; e Rita Jeep, composta em homenagem à Rita Lee.
Também em 1971, Jorge compôs a canção Mano Caetano, especialmente para Maria Bethânia gravar e lançar em seu disco A Tua Presença. A música foi escrita para o irmão de Bethânia, Caetano Veloso, que estava vivendo um exílio forçado em Londres, junto com Gilberto Gil, por conta da repressão e perseguição da ditadura militar.
Em 1972, Jorge Ben Jor realizou uma turnê de shows na Itália, Portugal e Japão, onde gravou um disco ao vivo, chamado On Stage.
No mesmo ano, o artista venceu o VII Festival Internacional da Canção, com sua composição Fio Maravilha, defendida por Maria Alcina. A canção homenageava o jogador João Batista de Sales, conhecido como Fio Maravilha, atacante do Flamengo na época, time do coração de Ben Jor.
Só que – também na época – o jogador acionou o compositor na justiça exigindo o pagamento de direitos autorais pelo uso do apelido, o que levou Jorge a passar a cantar “Filho Maravilha” em versões posteriores. Fio acabou voltando atrás e permitindo que Jorge Ben cantasse a música como no original.
Essa canção entrou para o disco Ben, também de 72, que trouxe outros imensos sucessos como: Morre o Burro Fica o Homem; O Circo Chegou; Que Nega É Essa; Paz e arroz; Caramba!… Galileu Da Galiléia; Domingo 23 (em que homenageia São Jorge); e o hit Taj Mahal.

10 anos de carreira e A Tábua de Esmeralda
Em 1973, o artista lançou o disco Jorge Ben – 10 anos Depois, que comemora seus 10 anos de carreira e do lançamento do seu primeiro disco, e traz regravações de seus maiores sucessos, vários que já citamos aqui, além de: A Minha Menina (lançada com sucesso pelos Mutantes, em 1968); Zazueira (lançada como hit por Simonal, também em 1968, e – depois – regravada por Elis Regina); Vendedor de Bananas (lançadas por Os Incríveis, em 1969); Cosa Nostra e Bicho do Mato.
No ano seguinte, lançou o antológico LP A Tábua de Esmeralda, considerado como o principal da carreira de Jorge Ben Jor, abrindo a sua fase ele mesmo chama de “alquimia musical”: “A maioria das músicas são alquímicas, mas sempre pela filosofia musical. Eu pretendo que a minha música traga paz de espírito e tranqüilidade para quem a escuta”.
O ritmo continua sendo aquele característico de Ben Jor, só que com algumas alterações nas divisões para acompanhar as extensas letras retiradas de grandes textos alquímicos.
Os arranjos têm efeitos espaciais complementando o clima cósmico de muitas das músicas, especialmente em Errare Humanum Est.
Esta nova face do trabalho de Jorge Ben remete às coisas celestes, mas não esquece as coisas simples: “Parto das coisas mais sérias até as mais simples, como o meu time de futebol, porque todas elas têm muita importância e motivo de existirem”.
Sobre o disco, Jorge Ben Jor completa: “Tenho muito respeito e admiração pelo trabalho de um alquimista, pois ele dedica toda a sua vida a estudar e procurar com uma fé e perseverança não comparável a coisa alguma (…) Os textos alquímicos são complicadíssimos, mas eu os vou interpretando de acordo com a minha compreensão, sentimento e bem estar”. Na faixa O Homem da Gravata Florida, Jorge homenageia Paracelso, um grande alquimista, e em Os Alquimistas Estão Chegando Os Alquimistas, a dedicatória é para todos os filósofos herméticos.
Produzido por Paulinho Tapajós, o álbum possui várias outras canções icônicas:; Menina Mulher da Pele Preta; Magnólia; Minha Teimosia, Uma Arma Pra Te Conquistar; Brother; O Namorado da Viúva; e Cinco Minutos (regravada com sucesso por Marisa Monte nos anos 2000); e Zumbi, uma importante homenagem a Zumbi dos Palmares, personagem histórico e líder do Quilombo dos Palmares, e a sua luta pela libertação dos escravizados, no século XVII.
Os versos “Angola, Congo, Benguela/ Monjolo, Cabinda, Mina/ Quiloa, Rebolo” representam os territórios africanos de onde vinham os escravizados para o Brasil.
É um dos principais discos da nossa história, tendo sido eleito em lista divulgada pela revista Rolling Stone Brasil, em 2007, o sexto melhor disco da música brasileira de todos os tempos.
Está gostando de saber tudo sobre a vida e a obra de Jorge Ben Jor?
Acesse aqui a PARTE 2 desta matéria especial sobre o aniversariante da semana!
por Lívia Nolla