
A Bossa Nova em 10 episódios
A Bossa Nova em 10 episódios
1 – Em 1955 e 1956, durante seus intensos estudos de violão, o cantor, compositor e violonista baiano João Gilberto percebeu que, se cantasse mais baixo e sem vibrato (com relação aos famosos cantores do rádio e de samba-canção), poderia adiantar ou atrasar o canto em relação ao ritmo, desde que a batida do violão … Continued


1 – Em 1955 e 1956, durante seus intensos estudos de violão, o cantor, compositor e violonista baiano João Gilberto percebeu que, se cantasse mais baixo e sem vibrato (com relação aos famosos cantores do rádio e de samba-canção), poderia adiantar ou atrasar o canto em relação ao ritmo, desde que a batida do violão fosse constante, criando assim seu próprio tempo. Compôs a canção Bim Bom, confiante de que havia encontrado a batida que queria.

2 – Em 1957, com 26 anos, João Gilberto muda-se para o Rio de Janeiro, para mostrar sua nova técnica aos músicos de lá e, quem sabe, conseguir gravá-la: com uma batida que alternava as harmonias com a introdução de acordes dissonantes, não convencionais, e uma inovadora sincopação do samba, a partir de uma divisão única, inspirada no jazz norte-americano, João Gilberto estava prestes a revolucionar e alterar, de forma irreversível, o DNA da música popular brasileira para sempre.
3 – Foi quando João apresentou a sua música a Roberto Menescal, que o levou para participar dos encontros que ele e alguns outros jovens músicos de classe média do Rio de Janeiro – como Ronaldo Bôscoli, Nara Leão, Sérgio Ricardo e Carlos Lyra – faziam em apartamentos da zona sul carioca, entre eles, o apartamento de Nara, em Copacabana. Todos esses músicos e uma geração de artistas, arranjadores e instrumentistas acabaram influenciadíssimos pela técnica de João Gilberto e iniciaram o movimento da Bossa Nova que, depois, expandiu-se para as universidades e para os bares cariocas, conquistando o Brasil inteiro e o mundo.
4 – Logo, João conheceu os cariocas Tom Jobim e Vinícius de Moraes, que haviam acabado de montar juntos o espetáculo Orfeu da Conceição. Os dois apresentaram para o baiano a sua parceria Chega de Saudade, guardada já há um ano. A canção, inicialmente, era um chorinho e João a transformou num samba enxuto, com o violão deixando de ser mero acompanhamento e dividindo o primeiro plano com a voz, trazendo fluidez rítmica e melódica à música.
5 – O marco inicial da Bossa Nova foi quando João Gilberto – primeiro gravou o violão da canção para uma gravação de Elizeth Cardoso, em 1958 – e depois, lançou um disco com a canção e o título Chega de Saudade, em 1959. João inovou na gravação do disco, ao pedir aos técnicos dois microfones: um para a voz e outro para o violão. Desse modo, a harmonia passou a ser mais claramente ouvida. Até então, gravava-se apenas com um microfone, com destaque para a voz em detrimento do violão.
6 – Em 1960, João Gilberto grava o seu segundo LP, O Amor, o Sorriso e a Flor, que – em 1962 – chegou aos EUA e iniciou a exportação da música brasileira. Esse LP, que contou com a canção que é a síntese dos fundamentos da bossa nova: Samba de Uma Nota Só, de Tom Jobim e Newton Mendonça. A partir daí, a Bossa Nova passou a ser conhecida mundialmente: os artistas do jazz ficaram impactados com a forma de João Gilberto fazer música, considerando-o um fenômeno. Foi a consagração do Pai da Bossa Nova.
7 – Com a gravação do seu terceiro álbum – chamado João Gilberto – em 1962, o artista eternizou-se de vez na música popular brasileira, tendo – em tão pouco tempo – influenciando tanto. O disco conta com músicas clássicas do gênero como: O Samba da Minha Terra e Saudade da Bahia, de Caymmi; O Barquinho, de Menescal e Bôscoli; Este Teu Olhar, de Tom Jobim e Insensatez, de Tom e Vinícius.
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8 – Neste mesmo ano de 1962, João, Tom e Vinícius fazem o histórico show O Encontro, única vez em que se apresentaram no mesmo palco, trazendo a público outros clássicos da Bossa Nova – ainda inéditos: Só Danço Samba e Garota de Ipanema, de Tom e Vinícius; Samba da Bênção e O Astronauta, de Vinícius e Baden Powell e Samba do Avião, de Tom Jobim.
9 – Em 1964, João Gilberto lança o disco Getz/Gilberto, junto com o saxofonista de jazz norte-americano Stan Getz, outro aclamado sucesso, que ganhou quatro Grammy Awards, entre eles Melhor Álbum do Ano e Melhor Gravação do Ano (Astrud Gilberto – esposa de João na época – e Stan Getz, em The Girl From Ipanema, versão em inglês da música). Tom Jobim também participou da gravação do disco e Garota de Ipanema tornou-se a música brasileira mais conhecida e regravada no mundo.
10 – A partir de 1965 acontece uma cisão ideológica no movimento da Bossa Nova: de um lado, um grupo manteve-se fiel à estética leve, caracterizada por letras de temas amenos e descompromissados com a realidade brasileira ou qualquer espécie de participação social, pelo tom suave e intimista e a forte influência do jazz.
De outro lado, outro grupo – formado por artistas como Baden Powell, Carlos Lyra, Marcos Valle, Dori Caymmi, Edu Lobo, Francis Hime, Vinicius de Moraes e Nara Leão – se associou ao movimento geral da cultura brasileira, no sentido de buscar uma base popular, temáticas de realismo e participação social nas letras, propondo uma reaproximação com compositores de samba do morro, como Zé Keti, Cartola, Nelson Cavaquinho e João do Vale. Um dos marcos dessa fase é a canção Arrastão, de Vinícius de Moraes e Edu Lobo, defendida por Elis Regina no I Festival de Música Popular Brasileira. O fim cronológico da Bossa Nova não significou a extinção estética do estilo e o movimento é uma grande referência até os dias de hoje.