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Chinaina: “Dicas que gostaria de ter ouvido quando comecei minha carreira musical”

Chinaina
14:31 01.08.2024
Autor

Chinaina

Cantor, compositor, apresentador, escritor e produtor musical
Música

Chinaina: “Dicas que gostaria de ter ouvido quando comecei minha carreira musical”

Músico e apresentador, fala sobre os espaços possíveis para artistas independentes. Vale para músicos e também para outros profissionais do mesmo ecossistema

Novabrasil - 01.08.2024 - 14:31
Chinaina: “Dicas que gostaria de ter ouvido quando comecei minha carreira musical”
empty stage and screen in the rays of light concert

Eu recebo muito material de bandas todos os dias. Além de músico, sempre fui pesquisador musical, já tive programa de rádio, apresento diversos programas de tv, mas, antes disso tudo, sou um entusiasta e amante da música brasileira.

Das coisas que recebo, umas chamam mais atenção que outras, por diversos motivos. No meio de tanta informação, nem sempre é a música que chega primeiro: pode ser um release, um trecho de uma entrevista ou o vídeo de uma apresentação ao vivo. Estou sempre atento a tudo, minha joia.

Quando eu comecei nos anos 90, o acesso à informação era precário e poucas gravadoras dominavam o mercado. A não ser que você fosse herdeiro e bancasse todo o processo de um disco para, talvez, ter algum resultado, o único caminho era ser descoberto por uma delas.

Um funil por onde passavam apenas alguns, o tal do fluxo centralizado. No contrato, aquelas letrinhas miúdas em que você entregava sua obra, sua alma e mais um pouco para a corporação.

Hoje, algumas dessas gravadoras continuam aí com seus estúdios, seus contratos e seus orçamentos, mas há muito caminho para a música independente fora delas, e se trabalharmos direitinho, é possível sim encontrar nosso espaço. E pela quantidade de música sendo lançada hoje, é preciso ser sagaz na hora de se organizar e se apresentar.

Por ter vivido tantas transformações dentro do mercado da música, deixo aqui algumas dicas que gostaria de ter ouvido quando comecei minha carreira. E falo com total propriedade, pois já assinei contratos ruins, já lancei discos sem planejamento e fiz um monte de burrada até me organizar. É claro que cada um tem seus caminhos e métodos, minha intenção aqui é apenas trocar experiências e informações. Ganhamos todos!

O FOCO É A MÚSICA

Para ser original tem que ouvir muita música e ter repertório. Saber usar cada referência escutada para criar algo realmente autoral. Acredite no que está produzindo, bote fé no seu som.

Leia bastante, conheça a história da música nos seus mais diversos estilos. Saber o que outros artistas já passaram e ter conhecimento dos movimentos musicais é importantíssimo, afinal, o passado é guia para o presente e futuro.

Gaste o tempo que for necessário aperfeiçoando o som da sua banda ou trabalho solo. Seja original e ache o seu próprio caminho musical, não se deixe levar por modismos. O mesmo serve para a avalanche de lançamentos recentes que têm o som repetido e com timbres todos iguais, como se fosse receita de bolo.

FORTALEÇA SUA BASE

A movimentação precisa começar junto aos seus pares, ou seja, artistas que também estão pensando e passando o mesmo que você. Junte as forças e amplie seu público. Organize shows em conjunto. Crie sua cena.

Isso não é nenhuma novidade, do Grunge ao Manguebeat foi assim. As bandas foram se juntando pra tocar em bares e inferninhos até que, em algum momento, aquilo começou a chamar a atenção do resto do país. Atualmente, o Queernejo, movimento de artistas sertanejos LGBTQIA+ fez o mesmo caminho e criou seu próprio festival, atravessando a falta de oportunidade em outros espaços.

Derrubar sozinho uma porta pesada é difícil, mas, em grupo, ela tomba fácil.

MELHORE SUA COMUNICAÇÃO

Tenha seu material de divulgação bem feito, claro e de fácil acesso. Vivemos numa era veloz e de pouca atenção, então, quanto mais certeiro for seu material, mais fácil fisgar quem tá interessado nele.

Um bom release não precisa ser gigante, precisa ser direto. Tente falar da sua música e das informações mais importantes nos primeiros parágrafos, que, no fundo, é o que importa.

Imagine um jornalista ou programador de rádio, TV e festival, que tem trocentas coisas pra fazer, tentando desvendar que tipo de música você faz ou de onde você é!

Manter as redes sociais e site atualizado e operante também é um ponto importante.

Já vi artista perder a chance de tocar em festival por não olhar a caixa de mensagens.

Esteja atento.

ORGANIZE SEU CATÁLOGO

É muito lindo fazer música. Ouvi-la tocar por aí, melhor ainda. Mas para sua obra render direitos – e dinheiro – quando estiver bombando, ela precisa existir burocraticamente. Sua obra é seu patrimônio. Pelas leis de direito autoral no Brasil, ela continuará trazendo renda aos herdeiros até 70 anos após a morte do artista.

Quantos álbuns “floparam” no ano de seu lançamento, mas décadas depois foram redescobertos e caíram no gosto das novas gerações? O primeiro disco do meu conterrâneo Di Melo, lançado nos anos 70, é um belo exemplo disso. Quando chegou ao mercado, ninguém deu muita bola e agora é cultuado. O mesmo vale para o Paebirú, disco de Lula Côrtes e Zé Ramalho, que hoje vale uma fortuna.

Lembre que o videoclipe também precisa de documento. Vejo os artistas investindo uma grana enorme nesse recurso, mas deixam de lado a parte burocrática da Agência Nacional do Cinema (Ancine), que é necessária para o clipe ser transmitido por qualquer canal de tv. Sem esses documentos, não tem acordo: a emissora não pode exibir. Você não investiu aquela grana toda no clipe pra ficar só na internet, né?

No Caça Joia, meu programa sobre novos talentos, fizemos uma oficina para ensinar os artistas selecionados a organizar todas essas exigências burocráticas para que a nossa curadoria não fosse excludente. Isso porque somos gente boa demais, em outros programas ou canais seu clipe simplesmente teria sido excluído.

A oficina Da composição ao clipe foi desenvolvida por Pamella Gachido, empresária artística, que também é diretora e curadora do Caça Joia. Confere nesse link o passo a passo direitinho de tudo e mais um pouco que citei nesse tópico.

A TV e as rádios têm uma importância enorme na descoberta e difusão de novos artistas. Falei sobre isso nesse texto aqui. Tenha seu catálogo organizado e não perca nenhuma oportunidade para sua música.

LUTE PELA SUA EQUIPE

O artista no palco é o resultado final de um trabalho feito em equipe. Roadies, técnicos de som e luz, produtores são parte importantíssima na entrega do show. São eles que vão deixar tudo perfeito para você apresentar sua arte com excelência.

Quando o Sheik Tosado, minha primeira banda, tocou no Rock in Rio III, gastamos todo o cachê contratando os melhores profissionais do país, e isso fez toda a diferença para realizarmos um show incrível, que reverberou muito além daquele momento. Não sobrou nenhuma merrequinha pra nós, os artistas, mas se abriram portas que logo pagaram o investimento.

Se você ainda não dispõe de grana para bancar uma equipe agora, tenha isso como uma prioridade no seu planejamento. É o passo que te separa do amadorismo, te garante uma estrutura organizada de trabalho e faz a economia da música girar.

Chinaina em início de carreira. Foto: Arquivo Pessoal.

FAÇA CONTATINHOS

Vá a shows de outros artistas, participe das festinhas, se inscreva em feiras de música, cursos e oficinas, mantenha um mailing atualizado para avisar sobre seus lançamentos. Conheça e troque com pessoas de todas as áreas da música. A cena musical se resolve nos encontros. É nessas que um programador de festival te conhece e pede o material da tua banda, que um parceiro do passado te reencontra e quer te contratar para algum evento… enfim, é no rolê que fazemos os melhores contatos.

Mande seu material para todos os sites e perfis especializados em música independente, que hoje são os grandes divulgadores dos trabalhos dos artistas. Mantenha contato com todos eles, faça sua música chegar na crítica especializada. Se possível, invista numa assessoria de imprensa. Separe um dinheirinho pra isso. Esses profissionais têm um acesso maior à mídia e poderão divulgar seu trabalho como ele merece.

MANTENHA SUA PERSONA DIGITAL EXISTENTE

Se no passado o cara precisava ir ao show, comprar o disco ou ouvir no rádio sua música para gostar dela, agora, rolando o feed, ele descobre tudo sentadinho no sofá. Vida real e vida virtual hoje são uma coisa só, e vale sempre aquela máxima, “quem não é visto (nas redes) não é lembrado”.

Não estou dizendo para você investir toda sua grana e tempo tentando viralizar, nada disso.

As mídias sociais são um ótimo espaço para espalhar o seu conteúdo e se aproximar da sua audiência. Você não precisa fazer dancinha (mas se quiser pode), você precisa é encontrar a melhor linguagem, que é única dentro de cada narrativa.

Existem vários artistas criando ótimas estratégias de divulgação, trabalhando suas músicas com maestria e autenticidade. O lance é achar a SUA forma de fazer isso.

TALENTO PESA MAIS QUE NÚMERO

Apesar de, ultimamente, TV, rádio, patrocinadores e festivais estarem sendo pautados por números de seguidores ou play nas plataformas digitais, o que estamos vendo é um grande desastre nessa fórmula. Shows de artistas com milhões de seguidores sendo cancelados pela fraca venda de ingressos. A mídia apostando em influenciadores que não conseguem arrastar o público digital para outros meios. As fazendinhas de like e números comprados para falsear uma carreira de sucesso também estão com tudo.

O produtor Felipe Vassao explica bem como a máquina funciona nesse vídeo:

Não estou dizendo que organicamente você não consiga grandes números, óbvio que é possível e temos diversos casos assim, mas em vez de focar nos números do algoritmo, foque numa carreira coesa que ande independentemente desses dados.

NINGUÉM TÁ TE FAZENDO FAVOR

Selo, gravadora ou empresário não faz caridade. Se chegaram em você, estão de olho numa oportunidade de negócio, e o negócio é você. Cansei de ver artista assinando qualquer coisa por puro deslumbre. Como se aquela alma caridosa tivesse caído do céu para salvar a sua carreira.

Anos atrás, uma banda que hoje é bem famosa, assinou um contrato no início de carreira vendendo 25 shows para um empresário, que pagou 5 mil por cada apresentação, num total de 125 mil reais. Um belo dinheiro para uma banda iniciante, né? Pois bem, em menos de dois meses a banda estourou nacionalmente e, enquanto o empresário enchia os bolsos cobrando 50, 60 mil por show, a banda continuou ganhando os mesmos 5 mil até o encerramento do contrato que havia sido assinado.

Recentemente, recebi uma proposta de contrato de uma editora querendo editar a minha parte na música que fiz em parceria com outro artista. Uma das cláusulas dizia que eles seriam os únicos detentores para negociar minha obra até em outras galáxias.

Sim, você leu isso mesmo.

OLHO NO LANCE

Seguindo o tópico acima, não assine nada na emoção e converse com advogados especializados para ler os contratos que chegam até você. Cláusulas são negociáveis e devem ser debatidas sem medo.

Isso também vale para as relações entre os membros de uma banda. Tudo tem que ser claro, não pode haver tabu para conversar sobre esses assuntos: divisão de royalties, propriedade de marca, responsabilidades de cada um. Conversar abertamente vai te livrar de dores de cabeça no futuro, vai por mim. E também pode evitar que amizades acabem por questões que ficaram mal esclarecidas ou foram interpretadas de forma diferente pelos integrantes do grupo.

Eu poderia ficar horas aqui escrevendo mais e mais dicas que recebo todos os dias. Sinto que é um dever repassar o que aprendi ao contar essas histórias. É uma forma de agradecer à música tudo o que ela fez por mim e também deixar o caminho menos tortuoso pra quem tá chegando. Quando nos juntamos, ficamos mais fortes.

O mercado da música tem mudado muito rapidamente, e é preciso estar atento e informado sobre suas transformações.

Apesar dessas mudanças, uma coisa é imutável: sua música.

Acredite no som que você faz porque é ele quem vai guiar todos os seus esforços rumo ao sucesso.

O foco é sempre a música!

E se você quiser trocar mais ideias sobre isso, é só procurar @chinaina nas redes sociais.

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Chinaina

Cantor, compositor, apresentador, escritor e produtor musical. Olindense, Chinaina foi projetado nacionalmente pela sua 1ª banda, Sheik Tosado. Com mais de 2 décadas de carreira consolidada, o artista está à frente da Banda Del Rey, além do projeto infantil Mini Jóia. Desde 2016 está no Multishow, comentando os maiores festivais de música do Brasil, no CanalBis com o Rock Estúdio e no Canal Futura, apresentando o Caça Joia.

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