
Boteco com cara de casa: o lugar onde clientes viram amigos e o petisco vale o prêmio
Boteco com cara de casa: o lugar onde clientes viram amigos e o petisco vale o prêmio
No Buteco da Vila, na Zona Leste de São Paulo, o sabor vem acompanhado de abraços, risadas, histórias e um petisco que derrete na boca


No coração da Vila Matilde, em uma esquina onde o tempo parece não ter pressa, o Buteco da Vila guarda mais do que receitas. Guarda histórias.
Não são poucas. São muitas. E todas atravessam uma calçada qualquer da zona leste de São Paulo, rumo à mesa onde se serve mais que cerveja gelada: serve-se pertencimento. Tem freguês que lava a louça, cliente que marca o consumo num papelzinho, vizinho que ajuda no balcão e um professor de física que virou chefe de cozinha. É desse jeito.

“Aqui é tudo do nosso jeito, e o nosso jeito funciona”, define Danilo di Pardo, 42 anos, um dos fundadores do Buteco da Vila. “Quem entra, entende. E volta. Porque o bar não faz só cliente. Faz amigo.”
E foi nesse clima que nasceu o Fiesta Cubana, petisco que o boteco apresenta na edição 2025 do Comida di Buteco. Três charutos de paleta suína defumada por mais de 10 horas, moldada em pasta com catupiry e servida com dois molhos: um barbecue de goiabada com pimenta e outro de queijo e alho negro. Vê-se na caixa, mas saboreiam-se três mundos diferentes.

Se me permite, leitor, neste momento terei que falar da experiência em primeira pessoa. O Fiesta Cubana derrete na boca. O sabor é presente, intenso, e muda completamente de acordo com o molho. Cada pedaço é uma experiência nova. Tudo isso numa rotina afetiva que atravessa o balcão.
A construção de um bar
A história do boteco começou despretensiosa. Danilo, o irmão dele e dois amigos conversavam em uma mesa qualquer de bar. “Por que a gente não monta o nosso?” E montaram. Duas geladeiras e uma churrasqueira eram tudo o que tinham. Nenhum fogão. Deu certo. Em três meses, o investimento estava de volta. Em dez anos, vieram mesas oferecidas por patrocinadores, prêmios, também de patrocinadores do Comida di Buteco, e uma clientela fiel.
Bruno Souza, 43, é professor de matemática e física. E, desde 2018, também é a mente por trás dos pratos do Buteco da Vila. Chegou como cliente, ficou como cozinheiro. “A gente gosta de contar uma história com cada petisco. Ano passado foi Lampião e Maria Bonita. Este ano, é a Cuba que a gente conheceu e amou. Queremos que cada cliente experimente um sabor que talvez nunca tenha provado em casa”, diz Bruno.

Charuto, pimenta e abraço
O Fiesta Cubana não é apenas um prato, é um convite para a festa. Quem pede, ganha de cortesia uma pina colada. “Tem sem álcool também, viu?”, garantem os donos. No recheio do petisco está a paleta suína defumada por horas, misturada com queijo, alho negro, temperos e muito serviço. Cada detalhe é pensado. “A gente já começa a preparar o prato que você vai comer hoje com pelo menos 72 horas de antecedência”, conta Bruno.
Leandro Grande, 36, é administrador e mora a poucos metros dali. Mas o motivo não foi apenas a localização. “A gente casou e, minha esposa e eu, decidimos morar aqui por causa do bar. A relação foi crescendo. Todo mundo se conhece, e quem não conhece acaba se conhecendo. Eles criaram um lugar de amigos para amigos”.
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Clientes que viram família
Danilo conta que, nos tempos da pandemia, foram esses amigos que sustentaram o bar. “Fizemos rifa, recebemos ajuda de fornecedor, vizinho, dono do imóvel. Teve gente que pagou consumo antecipado pra nos ajudar. A comunidade toda se juntou.”
Paulo Sérgio Rodrigues, 49, é outro cliente fiel. Mora perto e já chegou a sair do bar às 4h da manhã, depois de chegar às 17h do dia anterior para “só uma cerveja”. Levou sermão da esposa e banho frio em casa. “Esse boteco é tradição. Não é lugar de adultério. É lugar de amizade, de estar junto, de vida acontecendo”.
Comida de boteco é sobre estar junto
A rotina por trás do prêmio também é coletiva. “A gente testa muito. São três meses de ensaios e ideias, ingredientes que surpreendem. E depois vem a espera até o lançamento. Segurar essa ansiedade é difícil, porque o feedback é o que move a gente”, conta Bruno.
E mesmo na disputa, a irmandade segue. Danilo visita outros bares do concurso, paga a conta, torce pelos amigos. “É uma competição sadia. Todo mundo aprende. A gente vai, conhece, convida pra vir. Um deles veio outro dia com a família toda. Isso é muito legal.”
Do papelzinho à votação
Ao fim do prato, Danilo entrega a cédula de votação com um sorriso leve. “Comeu, tem que votar”, diz. A caneta é compartilhada. O papelzinho também. Assim como o sentimento de que o Buteco da Vila é mais que um bar. É um lugar para estar.
A edição 2025 do Comida di Buteco vai até 11 de maio e o Fiesta Cubana custa R$ 35, valor fixado pelo concurso. A pina colada é brinde da casa (uma delícia!). Assim como a memória de ter feito parte dessa história.